Epidemia de saúde mental afasta quase meio milhão de brasileiros do trabalho

Esses transtornos não só afetam a qualidade de vida, mas também têm um custo econômico significativo.

440 mil. Este foi o número de profissionais que entraram em licença médica em razão de transtornos mentais e comportamentais só no ano passado. De acordo com o Ministério da Previdência Social, isso representa um recorde histórico de afastamento por conta de problemas de saúde mental, sendo o dobro do registrado em 2014, com 203 mil solicitações, e quase 67% maior em relação a 2023. E a causa dessa epidemia é uma combinação de fatores: pressão por produtividade, falta de políticas corporativas eficazes e a dificuldade de lidar com as próprias emoções.

“A pressão por resultados e a falta de preocupação com a saúde mental dos colaboradores criam um ambiente de trabalho tóxico, no qual o estresse e a cobrança excessiva se acumulam. Somados a isso, a dificuldade de lidar com as próprias emoções, muitas vezes negligenciadas, agrava esse cenário, levando a quadros de transtorno de ansiedade, depressão e burnout. Sem espaço para o autoconhecimento e o cuidado emocional, os funcionários atingem um limite que só pode ser resolvido com afastamento”, afirma Ana Matos, psicanalista e autora do livro ‘O Caminho para o Inevitável Encontro Consigo Mesmo’.

E a procura por terapia deveria ser uma política pública já que, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), nosso país tem a maior taxa de ansioso no mundo e o quinto em casos de depressão. “A terapia não só ajuda a tratar esses quadros, mas também promove resiliência emocional e autoconhecimento, habilidades essenciais para enfrentar os desafios do mundo moderno. Incluir o suporte psicológico como uma iniciativa governamental e corporativa é um investimento em bem-estar social que reduzirá os custos com afastamentos e, principalmente, auxiliará na construção de uma sociedade mais saudável e equilibrada”, pontua Ana.

Esses transtornos não só afetam a qualidade de vida, mas também têm um custo econômico significativo. Um exemplo disso é outro estudo, este realizado pela  Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), que identificou que estes afastamentos provocam uma perda de R$397,2 bilhões por ano no faturamento das empresas. Na economia como um todo, a perda chega a 4,7% do Produto Interno Bruto (PIB).

Ainda sob os efeitos da pandemia
A Covid-19 agravou o cenário, com o aumento do trabalho remoto e a dificuldade de separar vida pessoal e profissional. “Muitos trabalhadores se sentem sobrecarregados e sem apoio emocional. E muitos deles chegam ao consultório com queixas de exaustão, insônia e até crises de pânico”, explica a psicanalista, que também é formada em filosofia.

Ela também destaca que a terapia focada no autoconhecimento ajuda os trabalhadores a lidar melhor com as pressões do dia a dia. “Quando entendemos nossas emoções e padrões de comportamento, conseguimos tomar decisões mais conscientes e saudáveis”, diz.

Ana Matos orienta que técnicas como a terapia cognitivo-comportamental (TCC) e a filosofia estóica como aliadas nesse processo. “A TCC ajuda a identificar pensamentos negativos, enquanto o estoicismo ensina a focar no que podemos controlar. Juntas, essas abordagens podem fortalecer a resiliência emocional”.

O papel das empresas
Enquanto os trabalhadores buscam ajuda, especialistas defendem que as empresas também precisam fazer sua parte. “Políticas de saúde mental, como programas de apoio psicológico e horários flexíveis, são essenciais”, afirma a psicanalista.

Desmistificar o divã para viver bem
A saúde mental não é apenas uma questão individual, mas um desafio coletivo que exige ação de todos os setores da sociedade. Enquanto os trabalhadores buscam autoconhecimento para lidar com suas emoções, as empresas precisam criar ambientes mais saudáveis e acolhedores. Como Ana Matos ressalta: “a mudança começa quando entendemos que cuidar da mente é tão importante quanto cuidar do corpo”.

Pietra Ribeiro
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