A coordenadora de alta complexidade do acolhimento social, no abrigo municipal de Capivari de Baixo, Varínea Marcelino Patrício, carrega em sua trajetória uma marca profunda: ela é sobrevivente de abuso sexual na infância. Mas essa cicatriz, longe de definir sua história, se tornou o motor de sua missão. Hoje, ela é uma inspiração viva para cada criança e adolescente acolhido pelo abrigo, especialmente para aqueles que enfrentaram o mesmo trauma que um dia ela viveu.
Com olhar atento, voz firme e coração generoso, ela compartilha não apenas cuidados e orientações, mas também a certeza de que é possível recomeçar. Suas palavras tocam, suas ações curam e sua presença fortalece. Ao contar sua história de superação, ela ensina a essas crianças que a dor não precisa ser o ponto final. Pode ser, sim, o ponto de partida para uma vida de dignidade, autoestima e proteção.
“Desde a infância eu vivi momentos extremamente difíceis, sofri abusos sexuais do meu próprio pai, assim como minhas irmãs. Foram anos marcados por muita dor, angústia e rejeição. Com isso, vieram várias tentativas de suicídio, vontade de morrer”, lembra.
Dificuldades
“O pior era que a maioria dos adultos, inclusive nossos familiares, não acreditava em nós. A única pessoa que nos ajudou foi uma tia, que teve a coragem de estender a mão. Nos levou ao Conselho Tutelar e à delegacia”, revela.
“Nas minhas lembranças, os abusos começaram a acontecer quando eu tinha quatro anos de idade, até os 11. Fui parar em abrigos institucionais e passei por várias tentativas de adoção frustradas, sendo ‘devolvida’ às instituições”, conta.
Perdão e superação
“Aos 16 anos fui emancipada, e, apesar de tudo o que vivi, escolhi trilhar por um caminho diferente. Decidi me tornar assistente social para ajudar crianças e adolescentes que viviam situações como as que eu vivi. Fiz a escolha de perdoar e seguir em frente, ressignificar minha história e fazer algo diferente”, ressalta Varínea. “Hoje, essas crianças veem em mim a esperança de um futuro mais positivo e isso também me dá força e esperança. Meu único objetivo é transformar minha dor em força para ajudar outras crianças e adolescentes a superarem suas dificuldades, oferecendo a elas o apoio para um futuro melhor”, completa.
Campanha visa estimular a denúncia de abusos
Neste mês, Capivari de Baixo se une à campanha nacional “Faça Bonito – Proteja nossas Crianças e Adolescentes”, um movimento essencial para combater o abuso e a exploração sexual infantil.
E entre as muitas histórias que comovem e fortalecem essa causa, a história de Varínea Marcelino Patrício lembra que é possível transformar dor em esperança, e sofrimento em acolhimento.
“A campanha existe para que nenhuma criança precise sofrer calada. E exemplos como o de Varínea nos lembram que denunciar é o primeiro passo para romper o ciclo de violência e construir um futuro mais seguro e humano”, pontua a prefeitura.
Se você souber de alguma criança ou adolescente vítima de abuso ou exploração sexual, não se cale. Denuncie. Você pode ligar para o Disque 100, procurar a delegacia mais próxima ou entrar em contato com o CREAS de Capivari de Baixo, no Centro. Atendimento também pelo WhatsApp 3623-5981.
“Tive, claro, ajuda de muita terapia e de Deus. E o mais importante, eu não me calei. Isso me fez sair daquela situação. Então, hoje, tudo o que passei me fortalece.Sou mãe, meu trabalho é gratificante e me vejo uma mulher incrível, empoderada e feliz”, conclui Varínea.
Diário do Sul