Escala 6 por 1 e o trabalho digno no Brasil

O fim da escala de trabalho 6 por 1, um dia de folga para cada seis trabalhados, ganhou força como reivindicação popular.

Com isso, impulsionou o debate sobre redução da jornada de trabalho no País, e um pré-projeto neste sentido conquistou, na Câmara dos Deputados, assinaturas de parlamentares em número suficiente para ser protocolado como Proposta de Emenda à Constituição.

A redução da jornada de trabalho é uma pauta que unifica os brasileiros de esquerda e direita como há muito não acontecia no País. Segundo pesquisa do DataSenado divulgada em maio, 73% dos brasileiros defendem que o governo crie incentivos para que as empresas reduzam a jornada sem redução de salários. Das pessoas pesquisadas, 85% dizem que teriam mais qualidade de vida se trabalhassem um dia a menos por semana, e 40% afirmam que teriam mais tempo para cuidar da família, um tema caro à direita.

Ainda, 55% das pessoas acreditam que menos tempo laboral melhoraria a saúde mental dos trabalhadores, e para 25%, melhoraria a saúde física. Jornadas menores e mais pausas também são apontadas como medidas de adaptação à elevação das temperaturas.

Para além da redução de horas trabalhadas, as demandas para melhorar a saúde e a qualidade de vida dos trabalhadores são diversas no País. Tramita no Congresso o Projeto de Lei Complementar 12/2024, que dispõe sobre direitos para motoristas autônomos intermediados por plataformas digitais. O projeto prevê garantias como remuneração mínima por hora trabalhada, limitação de jornada e pagamento à Previdência parcialmente custeada pela empresa de aplicativo.

O projeto enviado ao Congresso resultou de um grupo de trabalho que incluiu representantes de entidades associativas dos próprios trabalhadores de aplicativos, além de empresas e governo. Os entregadores em moto e bicicleta seguem mobilizados para obter o direito ao pagamento mínimo por hora desde o momento em que se conectam à plataforma do aplicativo.

As trabalhadoras domésticas contabilizam como conquista recente a aprovação da Política Nacional de Cuidados, que reconhece essas trabalhadoras como público prioritário no acesso a políticas públicas como creche, saúde, transporte e moradia.

Tanto o grupo de trabalho que ajudou a construir o projeto de lei complementar dos motoristas de aplicativos, quanto às contribuições das trabalhadoras domésticas ao Plano Nacional de Cuidados contaram com a participação de grupos organizados que, desde 2022, recebem recursos e fortalecimento institucional do Labora – Fundo de Apoio ao Trabalho Digno. Essa iniciativa do Fundo Brasil de Direitos Humanos coloca a filantropia no papel de fomentar debates e ações que se convertam em propostas inovadoras e abrangentes para um campo em intensa transformação, como é o trabalho.

A filantropia de justiça social e socioambiental, como o Fundo Brasil, assim como o Investimento Social Privado podem e devem ter, no debate democrático, o papel de impulsionar mudanças sociais estruturantes, capazes de produzir experiências positivas com possibilidade de serem replicadas, escaladas. Neste sentido, transferir recursos e capacidade técnica a grupos de base, mobilizados de forma autônoma pelas populações e comunidades que lutam por mudanças, é uma forma de jogar luz sobre possibilidades de inovação.

Assim como grupos de entregadores e domésticas, o Labora tem no portfólio mais de 90 coletivos de trabalhadores organizados, para os quais já doou mais de R$ 26 milhões. Esses grupos estão dedicados a construir propostas de trabalho digno para o setor da reciclagem, para camelôs, para trabalhadores rurais, extrativistas, indígenas, quilombolas e de comunidades tradicionais, para trabalhadoras sexuais, imigrantes, refugiados, em uma ampla e diversa abordagem sobre o presente e o futuro do trabalho.

No Brasil, a pauta do trabalho digno para as diversas categorias de trabalhadores precarizadas é uma pauta de justiça social, racial e de gênero, e de redução das desigualdades. Somos um País em que quem trabalha mais e em piores condições ganha menos. Segundo a Organização Internacional do Trabalho, 11 milhões de pessoas cumprem a escala 6 por 1. Os setores em que esse regime laboral é mais recorrente são o comércio – lojas, supermercados, bares, restaurantes -, e serviços – segurança patrimonial, funções básicas na saúde.

Também é preciso considerar que somos um País com alta informalidade, que atinge quase quatro em cada dez trabalhadores, de acordo com o dado mais recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgado em agosto. E que 99% das empresas no país são micro e pequenas empresas, que respondem por 55% dos empregos formais, segundo o Sebrae.

O fim da escala 6 por 1 é uma demanda justa. Mas, em um País tão complexo, é preciso ainda mais. Fortalecer o que os trabalhadores de cada setor e cada categoria esperam e entendem como dignidade no trabalho é o caminho para esse debate. A voz dos trabalhadores precisa ser ouvida e verdadeiramente considerada.

……………….

Ana Valéria Araújo, advogada especialista em direitos socioambientais e diretora executiva do Fundo Brasil de Direitos Humanos, e Amanda Camargo, advogada especialista em direito do trabalho e coordenadora do Labora – Fundo de Apoio ao Trabalho Digno

Últimas notícias

Pesquisadores descobrem proteína responsável pelo envelhecimento

Que notícia boa! Pesquisadores japoneses identificaram uma proteína chave...

Descoberta brasileira acelera regeneração de ossos após fratura em 30%

Viva a ciência! Pesquisadores de uma faculdade brasileira avançaram...

Mulher volta a enxergar após cirurgia de ceratocone em MG; “maior sonho”

Que alívio. Essa mulher sempre teve o sonho de...

Tigre apresenta oficialmente seus três novos atletas

O Criciúma apresentou oficialmente na tarde desta sexta-feira (07/03)...

Içara realiza primeiro treino da temporada

O Içara FC realizou na noite desta quarta-feira (05),...

Notícias Relacionadas